jueves, 7 de enero de 2010

A esperteza do tal "Macaco Beleza"


Texto de Augusto Mário Ferreira Jornalista/escritor, formado em capoeira pelo Mestre Bimba em 1956 Baseada em pesquisa histórica do advogado baiano GabinoKruschewsky ("A Tarde", 27/6/76, p. 6.), arquivadana hemeroteca sobre capoeira do advogado/tenente, Esdras Magalhães dos Santos (Mestre Damião)
Manoel Benicio dos Passos, por conta de suas simpatias monárquicas, mobilizava um grupo de capoeiristas de primeira linha para empastelar a manifestação estudantil com porretes de peroba e golpes de capoeira. Mulato sarará de cabelo crespo, atlético e corajoso, curtido de muitas cadeias por arruaças, Manoel Benício recebeu o apelido de Macaco Beleza, pela extrema feiúra de sua cara e pela agilidade de macaco com que jogava. Não deu outra: quando os estudantes interceptaram o cortejo do conde no sopé da Ladeira do Pelourinho e começaram a vaiar e a atirar ovos e tomates, a turma de Macaco Beleza caiu de pau (de peroba) em cima da estudantada. Em instantes dissolveu a manifestação, deixando muitos feridos pelas porretadas e pelos golpes de capoeira.
Vitorioso, subiu num caixote e mandou ver um discurso inflamado em defesa da monarquia. - Quero esse popular na recepção desta noite, no Palácio como meu convidado de honra - ordenou o conde D`Eu ao seu anfitrião, o conselheiro Almeida Couto. O Conselheiro tentou dissuadir o conde, informando tratar-se de um arruaceiro de péssimos antecedentes, um capoeirista (sinônimo de marginal na época), cuja presença na recepção poderia constranger os demais convidados. O conde contudo foi enfático: - O Baile é meu e o convidado é meu. Pouco tempo depois, já dois emissários do presidente da Província formalizavam o convite ao Macaco Beleza e negociavam com ele as condições estebelecidas pelo conselheiro Almeida Couto que começavam com uma advertência e uma ameaça: - Fica proibido de fazer besteiras. Se fizer, vai mofar na cadeia, depois que o conde for embora. Nem a advertência, nem a ameaça o preocupavam. Tinha outras preocupações:- Só vou lá se o conselheiro pagar uma roupa nova pra mim - sentenciou o capoeirista, que jamais primara pela elegância. Irritado pela petulância do capoeirista, que ele detestava e a quem mandara prender várias vezes, e sobretudo pelo incômodo convite do conde, o conselheiro Almeida Couto obrigou a alfaiataria do Palácio a costurar em poucas horas uma roupa de gala para o Macaco Beleza, que enfatiotado e exalando perfume barato de prostituta, foi o primeiro a chegar ao palácio. Depois de receber as honras da banda de música, ele esperou, como faziam os nobres, o anúncio de sua presença, feito pelo mestre de cerimônias para só então, com seu passo de malandro, atravessar o salão luminoso e enfeitado: - Sua Excelência, o nobre senhor Manoel Benício dos Passos, convidado de honra em nome de sua Alteza Imperial. O anúncio supreendeu a oficialidade do Corpo a Guarda presente e revirou o estômago do Conselheiro Almeida Couto, que, por precaução isolou Macaco Beleza bem no fundo do salão. Após a chegada de todos os convidados, o conde D`Eu, com a imponência dos seus quarenta e dois anos, apareceu na mesma porta por onde entrara Macaco Beleza e esperou a vez do seu anúncio: - Sua Alteza, representante do Imperador D. Pedro II, comandante em chefe das forças navais e terrestres, vitoriosas na guerra contra o Paraguai. Luís Felipe Maria Fernando Gastão D`Orleans, o conde D`Eu! Macaco Beleza nem esperou o fim dos aplausos. Sob o olhar irado do Presidente da Provínica, atravessou o centro vazio do salão e, quebrando o protocolo, supreendeu o conde com um abraço vigoroso, desvencilhou-se e se apresentou ao conde, declamando em tom solene uma trova que demorara para decorar:
"Manoel Benício Passos, vulgo Macaco Beleza. Escravo da Monarquia e servo de Vossa Alteza".
http://www.azania.com.br/macacobeleza.html
OTRA CITA: Enciclopédia brasileira da diáspora africana‎ - Página 402Nei Lopes - 2004 - 715 páginas MACACO BELEZA (século XIX). Apelido de Manuel Benício dos Passos, personagem da história da Bahia. Em 1889, em Salvador, na localidade conhecida como Taboão ...
OTRA CITA:
UMA LINDA VISITA À ABOLIÇÃO BAIANA
Há um grande livro na praça. É "Encruzilhadas da liberdade" (Editora da Unicamp), de Walter Fraga Filho, professor da Universidade do Estado da Bahia. Conta a vida dos escravos e de seus senhores na região do Recôncavo antes e depois da Abolição. Fraga foi aos inventários, registros policiais, notícias da imprensa, correspondências de escravocratas e tradições orais. Misturou tudo com a alma de quem vivia a época e saiu com uma obra que coloca o leitor na cena dos interesses, sofrimentos e alegrias dos baianos de outrora. Sua descrição do 13 de maio em Salvador parece saída de uma página de Jorge Amado. A multidão sambando atrás das bandas, o trio elétrico da época. Nela, estava o "Macaco Beleza", um conhecido da polícia: "Homem cor de bronze, de estatura hercúlea, disposto à luta corpórea, sem instrução, porém sempre pronto a impugnar com ousadia e inteligência as opiniões dos contrários." Quando Salvador cantava a Abolição, "Macaco Beleza" foi visto calado, chorando.

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